Por Paula Nunes [1]
Na última quarta-feira (25.11.20), o Senado aprovou o Projeto de Lei nº 4458/2020, que prevê uma série de mudanças na atual Lei de Recuperação de Empresas e Falência. O Projeto agora segue para sanção presidencial.
De forma geral, o projeto aprovado buscou ampliar os meios e incentivos para as empresas em recuperação judicial, bem como regulamentar uma série de situações que já acontecem na prática desses processos, adequando a legislação à interpretação que os juízes e tribunais vêm dando à Lei 11.101/05 ao longo de seus 15 anos de vigência.
Dentre os principais pontos de mudança que o aludido PL traz, podemos destacar:
Dívidas tributárias – Aumento do prazo para pagamento de dívidas tributárias de 7 para 10 anos, bem como a possibilidade pagamento de até 30% da dívida por meio da utilização de 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a possibilidade de dividir, em até 24 meses, débitos atualmente proibidos de serem parcelados, como os relativos a tributos com retenção na fonte ou de terceiros e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Financiamento de risco – O devedor em recuperação judicial poderá, se autorizado pelo Juízo, fazer contratos de financiamento para tentar salvar a empresa da falência. Esse financiamento poderá ser garantido com bens da empresa, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária.
Diante de tal previsão, o texto altera a ordem de pagamento dos credores, dando preferência para os créditos derivados de dip financing.
Proteção do adquirente de bens – Amplia a blindagem do adquirente, explicitando que ele não assumirá dívida de qualquer natureza, inclusive, derivada de normas anticorrupção.
Créditos trabalhistas – Permite a inclusão de credores trabalhistas se houver negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional.
O texto também aumenta de 1 para 2 anos o prazo máximo para pagamento de crédito trabalhista por empresa em recuperação judicial, caso aprovado pelos credores na AGC.
Distribuição de lucros – Proíbe a distribuição de lucros e dividendos durante o processo de recuperação judicial.
Meios de recuperação judicial – Insere na lista de meios de recuperação, a conversão da dívida em capital social e a venda integral da empresa.
Venda de ativos – A lei em vigor exige autorização judicial para a venda de ativos não prevista no plano de recuperação judicial e o PL 4.458/2020 amplia as exigências acrescentando que, os credores poderão impugnar a autorização dada pelo Juízo e decidir o tema em assembleia.
Consolidação processual x consolidação substancial – O projeto regulamenta os pedidos de consolidação processual e consolidação substancial. A consolidação processual permite que empresas que integrem uma sociedade ingressem conjuntamente com um só pedido de recuperação judicial, porém isto não impede, pelo projeto, que alguns devedores tenham falência decretada e outros não.
Na consolidação substancial, o grupo societário em recuperação judicial não apenas tem o pedido processado conjuntamente, como as empresas que o integram perdem sua autonomia patrimonial. Com isso, unificam-se as listas de credores do grupo e se permite que o plano de recuperação judicial seja deliberado em assembleia única, com todos os credores do grupo econômico consolidado.
Registro de falidos – Os registros públicos de empresas serão obrigados, em cooperação com os Tribunais de Justiça, a manter banco de dados público e gratuito, disponível na internet, com a relação de todos os devedores falidos ou em recuperação judicial.
Homologação de credores – Permissão para encerramento da recuperação judicial antes da homologação do quadro geral de credores
Os credores que não forem reconhecidos antes do encerramento terão suas ações redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e observarão o rito comum.
Deliberação virtual – Regulamenta a Assembleia Geral de Credores Virtual.
Impostos – Dispensa o devedor de pagar imposto de renda e CSLL em caso de ganho de capital derivado de venda de bens em recuperação ou falência, salvo se o adquirente for empresa do mesmo grupo econômico.
Produtor Rural – Autorização para que produtores rurais que atuem como pessoa física peçam recuperação judicial desde que o valor da causa não exceda 4,8 milhões.
Insolvência transnacional – Regulamenta a recuperação judicial de empresas que possuem negócios transnacionais.
Decretação de falência – Amplia a lista de situações em que o Juízo pode decretar a falência do devedor, incluindo na lista o descumprimento de pagamento em parcelamento de créditos tributários ou se, vendida a empresa em recuperação judicial, não sobrar recursos para honrar os créditos tributários e os créditos de credores não sujeitos ao plano.
Plano de recuperação judicial – Prevê a possibilidade de os credores apresentarem um plano de recuperação alternativo, quando o plano do devedor for rejeitado em Assembleia Geral de Credores.
Suspensão de ações – Permite que o stay period (180 dias de suspensão de ações contra a empresa em processo de recuperação judicial a partir do deferimento do pedido) seja prorrogado por duas vezes, sendo a primeira a critério do Juízo e a segunda a critério dos credores.
O projeto permite ainda que o Juízo da recuperação interfira, por cooperação jurisdicional, na constrição de bens em sede de execução fiscal ou de reintegração de posse em leasing ou, ainda, em ação de busca e apreensão em propriedade fiduciária, sempre que os bens sob constrição sejam essenciais ao negócio do devedor empresário.
Inobstante a divergência de opiniões, a aprovação do PL 4458 pelo Senado abre nova perspectiva para a Recuperação Judicial. Isso porque, em tempos de crise, especialmente da pandemia, mais do que necessário viabilizar a recuperação judicial de empresas em crise econômico-financeira.
Por fim, registra-se que há uma expectativa de que a sanção presidencial ocorra de forma urgente, de modo que as novas regras entrem em vigor no início de 2021 e, por conseguinte, com nova perspectiva para os empresários e o crescimento da economia.
[1] Graduada em Direito pela PUC-GO, Advogada e pós-graduanda em planejamento empresarial e tributário.