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há 4 anos

O plano de recuperação judicial especial para produtor rural, ME e EPPs


RESUMO: O artigo consiste em trazer, em síntese, alguns aspectos relevantes do plano de recuperação judicial especial, previsto na Lei nº 11.101/05, do qual fazem jus as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte e, agora, o Produtor Rural.[1]

 

As microempresas, empresas de pequeno porte e, agora, o produtor rural, com o advento da Lei nº 14.112/20, possuem uma grande carta na manga, que é pouco utilizada quando se trata de recuperação econômica e superação da crise financeira.

Sabe-se que as microempresas, empresas de pequeno porte e os produtores rurais são os grandes responsáveis pelas molas propulsoras da economia brasileira e, ao mesmo tempo, são os que mais sofrem com mudanças abruptas que ocorrem nos cenários econômicos, das quais decorrem, muitas das vezes, o “fechamento de suas portas” ou a necessidade de se buscar socorro na legislação recuperacional para se soerguerem.

Assim, pensando em um regime jurídico de insolvência que amparasse de maneira célere e eficiente os microempresários, EPP’s e produtores rurais quando estes necessitam recorrer ao Judiciário para buscar sua recuperação, o legislador trouxe a figura da Recuperação Judicial Especial, prevista na Seção V, artigos 70 a 72 da Lei nº 11.101/05, que, em síntese, consiste na apresentação de um plano especial de recuperação judicial que prevê um tempo mais célere de recuperação e dispensa a votação do plano em assembleia geral de credores.

Sendo assim, o devedor que deseja valer-se do instituto deve preencher alguns requisitos legais, bem como se enquadrar no conceito de microempresa, empresa de pequeno porte (EPP) ou produtor rural, nos termos exigidos pela Lei.

Em se tratando de recuperação judicial especial, a particularidade consiste no fato de que o devedor deverá indicar na petição inicial do pedido de soerguimento a sua intenção de apresentar um plano especial de recuperação, sendo que, caso permaneça silente quanto a este ponto, entende-se que o solicitante optou pela recuperação judicial “comum”.

Após o pedido, o devedor terá o prazo de 60 dias, contados da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial especial, para apresentar o seu plano de recuperação judicial especial.

O referido plano especial pode prever o parcelamento da dívida concursal em até 36 parcelas mensais, corrigidas obrigatoriamente pela taxa SELIC, podendo conter, ainda, a proposta de abatimento do valor das dívidas, sendo que o primeiro pagamento deve ocorrer em até 180 dias contados a partir da distribuição do pedido de recuperação judicial.

O plano especial abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3º e 4º do artigo 49.

Com a recente derrubada dos vetos presidenciais, o artigo 4º da Lei 14.112/20, que altera o artigo 11 da Lei 8.929/94,  não se sujeitarão ainda os créditos e as garantias cedulares vinculados à Cédula de Produto Rural Física, em casos de antecipação total ou parcial do preço, subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, exceto se por motivo de caso fortuito ou força maior que impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.

Ou seja, caso o Produtor Rural que emita CPR Física para vender antecipadamente a safra e vier a requerer a Recuperação Judicial ordinária ou especial, tem que entregar a produção, tendo em vista que a CPR Física não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial, com uma ressalva. Caso a entrega não se dê por casos de força maior ou caso fortuito, a CPR Física se sujeitará à recuperação judicial ordinária ou especial. Além disso, para optar pela recuperação judicial especial, o passivo concursal do produtor rural não poderá ultrapassar o limite de R$ 4,8 milhões.

Ademais, em se tratando de produtor rural, o plano especial não abrangerá os créditos relativo à dívida constituída nos últimos 3 (três) anos anteriores ao pedido de recuperação judicial, que tenha sido contraída com a finalidade de aquisição de propriedades rurais, bem como as respectivas garantias[3]. Além disso, para optar pela recuperação judicial especial, o passivo concursal do produtor rural não poderá ultrapassar o limite de R$ 4,8 milhões[4].

Outra particularidade envolvendo o referido plano especial é a de que o documento estabelecerá a necessidade de autorização do Juiz, após ouvido o Administrador Judicial e o Comitê de Credores, para que o devedor aumente as despesas ou contrate empregados. Com isso, objetiva-se evitar ao máximo que o sujeito em recuperação aumente seu passivo durante o cumprimento do plano.

Com efeito, a vantagem desta modalidade especial é uma recuperação judicial mais célere, haja vista que não se convocará assembleia geral para votação do Plano de Recuperação Judicial[5].

Contudo, há de se ressalvar que, em havendo objeção de credores que representam mais da metade de qualquer uma das classes dos créditos abrangidos (por cabeça nas classes I e IV e pelo valor e cabeça nas classes II e III, conforme artigo 45, §§1º e 2º da Lei 11.101/05), o Juiz rejeitará o pedido e decretará a falência automaticamente.[6].

Ressalta-se, também, que nesta modalidade de recuperação judicial, o Administrador Judicial terá sua remuneração fixada no máximo 2% do valor devido aos credores[7], enquanto na recuperação judicial comum esse percentual pode chegar a 5% do passivo concursal.

Deste modo, o plano de recuperação judicial especial se mostra um tanto quanto mais eficiente, econômico e, ao mesmo tempo, confere maior agilidade ao soerguimento do que um “plano comum”, seja pelas condições de pagamento, pela não submissão ao crivo da Assembleia Geral de Credores ou até mesmo por oferecer aos credores uma maneira mais rápida de recebimento de seus créditos.

Apesar de possuir uma boa eficácia, o instrumento é pouco utilizado pelos Microempresários, Empresas de Pequeno Porte e Produtores Rurais, que em muitas oportunidades optam por uma recuperação judicial comum, que permite uma maior liberdade no estabelecimento de prazos, carências e juros para pagamento dos credores.

Assim, para optar por esta modalidade de recuperação judicial é necessária uma análise criteriosa feita por um profissional especializado, que saberá identificar o melhor remédio para que a empresa ou o produtor rural alcancem seu soerguimento econômico-financeiro.

 

 

[1] João Victor Zafred é graduando em direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Na Romanhol Advogados atua como trainee na área de recuperação judicial e falências.

[2] Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. § 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial. § 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei.

[3] Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. § 9º Não se enquadrará nos créditos referidos no caput deste artigo aquele relativo à dívida constituída nos 3 (três) últimos anos anteriores ao pedido de recuperação judicial, que tenha sido contraída com a finalidade de aquisição de propriedades rurais, bem como as respectivas garantias.

[4] Art. 70-A. O produtor rural de que trata o § 3º do art. 48 desta Lei poderá apresentar plano especial de recuperação judicial, nos termos desta Seção, desde que o valor da causa não exceda a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais).

[5] Art. 72. Caso o devedor de que trata o art. 70 desta Lei opte pelo pedido de recuperação judicial com base no plano especial disciplinado nesta Seção, não será convocada assembleia geral de credores para deliberar sobre o plano, e o juiz concederá a recuperação judicial se atendidas as demais exigências desta Lei.

[6] Art. 72. Parágrafo único. O juiz também julgará improcedente o pedido de recuperação judicial e decretará a falência do devedor se houver objeções, nos termos do art. 55, de credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes de créditos previstos no art. 83, computados na forma do art. 45, todos desta Lei.

[7] Art. 24. O juiz fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração do administrador judicial, observados a capacidade de pagamento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes. § 5º A remuneração do administrador judicial fica reduzida ao limite de 2% (dois por cento), no caso de microempresas e de empresas de pequeno porte, bem como na hipótese de que trata o art. 70-A desta Lei.


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